No domingo, o Brasil vai às urnas escolher seus novos governantes. Não é uma eleição comum, por uma série de motivos:
1. É a primeira eleição presidencial de um Brasil classe média. Por séculos este aqui foi um país enormemente desigual, dividido entre poucos com muito e muitos com pouco. Isso mudou, graças a uma série de motivos: a estabilidade conquistada com o real, as políticas distributivas dos últimos oito anos, a demanda chinesa por commodities, o aumento da produtividade por aqui. É claro que o país ainda tem uma cacetada de problemas enormes, mas, pela primeira vez em muito tempo, temos a chance de escolher um presidente num ambiente de prosperidade. Temos a chance de escolher uma visão de país, em vez de uma solução para a crise do momento. Poderíamos estar debatendo o que queremos para o futuro, em vez de simplesmente discutir os velhos ressentimentos entre ricos e pobres, entre direita e esquerda, seja lá o que isso queira dizer.
2. É a primeira eleição presidencial de um país conectado. Mais de 60% do Brasil têm acesso à internet, um meio horizontal de informação. Era nossa chance de fazer um debate participativo, com candidatos dispostos a ouvir ideias da sociedade em vez de simplesmente se portarem como sabe-tudo.
3. É a primeira eleição presidencial após o crash de 2008. E também a primeira após o consenso sobre a gravidade das mudanças climáticas. Era nossa chance de discutirmos oportunidades e riscos para o país. De propormos modos de posicionar o Brasil estrategicamente como uma economia verde, levando em conta a imensa riqueza de biodiversidade daqui, o imenso potencial produtor de energia limpa – e a imensa vulnerabilidade brasileira às mudanças climáticas.
Por tudo isso, vou às urnas no domingo com um gosto amargo na boca: a sensação de que estamos perdendo essas oportunidades. O debate, no geral, foi tão ressentido e pobre quanto sempre é. Os políticos são os mesmo de sempre e têm se comportado como sempre se comportaram: donos da verdade, paternalistas, sem disposição para debater com a sociedade. A internet foi cerceada pela Justiça Eleitoral, que proibiu publicidade online e fez o que pôde para preservar um modelo eleitoral caquético no qual o tempo de TV é distribuído de maneira a impossibilitar que ideias novas surjam e sejam debatidas. O governo abusou de seu poder e menosprezou a liberdade de imprensa. A oposição tradicional agiu com histeria e mal falou de propostas.
Ao longo dos últimos dois meses, tentei entrevistar Dilma e Serra sobre como a discussão sobre mudanças climáticas muda a forma de administrar o país. Nenhum dos dois respondeu às minhas seguidas solicitações. Estavam com a agenda lotada, me disseram seus assessores. Eu disse que estaria disponível a me adequar à agenda deles e dei um prazo de mais de um mês para que me encaixassem. Nenhum dos dois achou que o tema justificaria o esforço.
Por tudo isso, não me sobraram muitas dúvidas sobre como votar no domingo. Não dá para votar pela eternização no poder de um grupo político, ao custo do enfraquecimento das instituições democráticas brasileiras. Não dá para votar numa oposição sem ideias, sem disposição para o debate. Não dá para votar em campanhas eleitorais criadas por marqueteiros, gente que não acredita em nada, apenas usa da ciência da persuasão para dizer ao eleitor aquilo que as pesquisas dizem que o eleitor quer ouvir. Não dá mais para eleger PT e PSDB enquanto eles estiverem coligados com partidos que não ousam dizer seus nomes.
Antes dava. E, justiça seja feita, tanto PSDB quanto PT entregaram o Brasil, ao fim de seus governos, melhor do que o receberam em muitos aspectos. Mas não dá mais. O mundo mudou e não dá para votar como se ele não tivesse mudado – como se as mudanças climáticas fossem lenda, como se o Brasil não tivesse potencial para produzir mais que commodities, como se a crise de 2008 não tivesse acontecido, como se a internet não existisse, como se o Brasil não precisasse de um novo modelo de educação, de um novo sistema político, de novas ideias. Não dá para não mudar.
E por isso resolvi declarar publicamente meu voto em Marina Silva. Não estou me filiando ao seu partido, nem me engajando em sua campanha – estou apenas declarando meu voto, sem prejuízo à minha independência jornalística. (Declaro também que fiz uma doação online de R$ 100 para sua campanha na semana passada, porque acredito que as pessoas físicas deveriam sustentar as campanhas, não os grandes lobistas.)
Voto em Marina mesmo sabendo que, mesmo que ela pudesse ganhar, dificilmente teria condições de governar no atual sistema político. Voto nela em repúdio às outras alternativas que me são oferecidas. Voto nela para afirmar que, em 2014, não quero ter que sentir de novo o gosto amargo de perder uma oportunidade.
Voto nela com satisfação. Espero que o seu voto, seja ele em quem for, também lhe dê satisfação.