Em 1967, um pesquisador fez um experimento clássico da história do comportamento animal. Ele colocou três grupos de cachorros em três jaulas separadas. Uma era o grupo-controle, onde nada acontecia. Nas outras duas, o cientista aplicou choques elétricos dolorosos nos cachorros – naqueles tempos, os cientistas não davam muita bola para os direitos dos animais. Em cada uma das duas jaulas, havia uma alavanca. Numa delas, quando os cachorros batiam na alavanca, o choque parava. Na outra, não. O choque parava e recomeçava, mas sem que os cachorros tivessem qualquer controle.
Aí, num segundo momento, os coitados dos cachorros foram colocados numa sala com uma cerca baixa e de novo receberam choques. Dessa vez, era fácil escapar da dor: bastava pular por cima da cerca e os choques paravam. Os cachorros do grupo-controle e os que, na primeira fase do experimento, ficaram na sala onde a alavanca funcionava, escaparam tranquilamente da tortura. Os que estavam na sala onde a alavanca não funcionava, no entanto, ficaram estendidos no chão, ganindo, levando um choque atrás do outro, sem se mover. Eles tinha aprendido a não ter esperança.
A teoria da “learned hopeleness” (desesperança aprendida), elaborada pelo psicólogo americano Martin Seligman a partir desse experimento, foi muito citada ontem em Washington no Transparency Camp, uma conferência da qual eu participei que discutia transparência pública e participação cívica. Estávamos conversando sobre esse senso de apatia que domina a política no mundo. Por toda parte (inclusive aqui na área de comentários deste blog), se ouve com frequência comentários do tipo “isso nunca vai mudar, as pessoas são más, a política nunca vai funcionar, não adianta querer fazer as coisas de um jeito diferente, qualquer tentativa de transformar o mundo é ingenuidade”. Isso é “desesperança aprendida”. Puxamos tanto as alavancas sem ver as coisas fundamentais mudarem que ficamos como os cachorros da última sala: deitados no chão, deprimidos, achando que no final vai dar tudo errado.
Isso me faz pensar no tema da pesquisa que estou fazendo agora: política de drogas. Oitenta anos atrás, um grupo de idealistas utópicos com inspiração religiosa, movidos pela boa intenção de tentar acabar com o sofrimento causado pelas drogas, resolveu inventar um sistema ultra-radical para lidar com esse problema: a proibição. Eles puxaram as alavancas, proibiram as drogas e nada mudou: o sofrimento continuou. Ao longo das décadas, o que eles fizeram foi tornar o projeto deles cada dia mais radical: a cada década gastou-se mais com armas e prisões para acabar com as drogas. Quanto mais radical a proibição, maior o sofrimento, maior o consumo de drogas, mais problemas eram causados por elas.
A proibição falhou, obviamente. Todos os países do mundo tentaram, nenhum conseguiu. Mas nossa sociedade está tão tomada por um senso de “desesperança aprendida” que não há espaço para ideias. Só o que é permitido é mais do mesmo. Os defensores do radicalismo da proibição bloqueiam qualquer tentativa de discutir o assunto e de chegar a uma política menos ingênua para lidar com as drogas. É proibido discutir, é proibido debater, é proibido propor, é proibido pensar. Só o que se permite é ficar deitado no chão, ganindo. Pior, quando alguém tenta dar alguma ideia nova, a matilha de cachorros deprimidos parte para cima, a dentadas.